terça-feira, 30 de abril de 2013

Raquel

Com 6 anos de idade!...

50 pessoas... MARIA CÂNDIDA DA SILVA VALENTE FIGUEIREDO ALVES


Mãe, que verdade linda
O nascer encerra                                                                                      

Eu, nasci de ti .
Como a flor da terra !
                   Matilde Rosa Araújo

A minha mãe ,  já não está na terra…apenas plantada no meu coração. Foi uma mãe muito paciente, terna e de uma grande sabedoria. Senti o seu amor cada dia…escrever sobre ela é difícil. Tenho na memória as mais gratas recordações e lembro as suas gargalhadas contagiantes de uma alegria imensa. A fé era outro seu atributo que exemplarmente levou até ao fim desta vida terrena. Ficou um grande vazio com a sua partida e por vezes imagino-a junto de mim a viver os meus sucessos e tristezas… Houve momentos especiais em que me lembrei dela de uma forma  particular. Por exemplo quando concluí a Licenciatura em Ciências da Educação e, no dia em que fui “cartolada” ,só o meu pai estava lá, e faltou para sempre na minha fita laranja a assinatura da minha querida mãe (com a sua bela caligrafia!). Por isso…com essa tristeza desabafei:

Metades                                                                                

Metade da fita por assinar
Metade dos beijos por receber
Metade da alegria por repartir
Metade de mim à chuva...
Metade ao sol!
Só metade senti...


Deste laranja em metade
Um amarelo azedo escorreu
O teu amor vermelho adormecido
Congelado em mim
Não derreteu...
Gelou metade de mim...


Só metade de mim
 de laranja foi vestido.
Só metade de mim
Enlutado se enegreceu.
Nas duas metades de mim
Te senti...e desejei...
Te revivi... e  busquei...
Em ambas te amei!...
Em ambas a Deus odiei!

Maio /2002


Após a sua partida escrevi vários textos como forma de contornar a saudade. Ora aqui está uma carta:


Água de madeiros, 2 de Julho de 1996

Sabes mãe, o mar daqui continua lindo. A paisagem quase imutável!
O pai tem continuado só e eu tenho continuado eu. Às vezes um outro mar escorre dos meus olhos. As lágrimas são salgadas e tu sabes que eu gosto do doce. E estou mais gorda…tenho comido muito doce. Mas nunca choro doce, porque será mãe? Pois é isso, chorar é sempre triste, triste e amargo! A tristeza salga e endurece a vida e , se nós deixarmos a vida fica intragável. E tu que tinhas um riso doce e eu podia olhar-te sem engordar! Era bom…lembras-te?
Diz lá mãe, é verdade que estás bem?é bom viver aí distante? Não tens dor nem tristeza? Nem salgado?
Com a tua partida deixei de saber exprimir correctamente o meu sentir. Aqui dentro de mim ficou uma tempestade e a sequência de ideias são difíceis. É que há um mar encapelado, ruidoso, tempestuoso e salgadíssimo cá no meu interior e as ondas viram palavras, gestos e lágrimas em turbilhão.E, por muito que as ondas se espraiem continua uma fúria imbatível e incompreensível em vai-vém. Quando é que vens mãe?
Tua filha
Raquel


segunda-feira, 29 de abril de 2013

50 pessoas...MARIA EDUARDA AZEVEDO





Tinha eu os meus 6 anos cheios de vivacidade quando entrei para a escola primária nº 30 - S. Roque da Lameira, aluna da 1ª classe da senhora professora D. Maria Eduarda Azevedo.
 Esta professora acompanhou-me desde esse momento inicial até ao último dia da 4ª classe.Se na altura tinha por ela uma deferência e admiração especiais, hoje isso redobrou. Era uma mulher que eu achava muito alta. Tinha um porte elegante, não só por ser magra, havia nela uma elegância muito própria. A sua delicadeza feminina, o seu perfume, a forma de vestir, o aprumo dos seus materiais, a alvura da bata e o seu ar sempre arrumado, davam-lhe o título de uma autêntica senhora.



                                                                         
A única professora que conduzia e que chegava à escola no seu Volkswagen carocha preto.
Como professora era exigente mas compreensiva. Hoje reconheço que face ao seu desempenho e ao tipo de atividades que propunha era de facto "à frente" para o seu tempo.Valorizava também a criatividade e os trabalhos manuais. Por outro lado acho que por minha causa, esqueceu a parte religiosa do programa. A única vez que rezamos foi uma situação invulgar. Eu fechei os olhos à espera que a professora orasse...lembro que se gerou um profundo silêncio de admiração e que todos pararam a olhar-me. Rezaram mas a partir desse momento nunca mais se repetiu tal situação.

sexta-feira, 26 de abril de 2013

50 pessoas...JOSÉ GONÇALVES

A imagem que guardo é a de um homem exemplar e bom...profundamente altruísta, crente e positivo. Privei com ele, sobretudo em criança. Era Pastor da Igreja Protestante que eu frequentava, com a família. Depois, por opção dele e de sua esposa Ulla, retirou-se da Igreja, para desenvolver(em) um trabalho religioso de outro âmbito. Voltei a encontrá-lo há alguns anos, já regressado de África, com um ar quebrantado, sempre humilde e com uma afabilidade extraordinária. Acho que Deus a ser bom, amoroso e próximo de nós, terá espelhado no Pastor Gonçalves essas características . Ele é de facto um santo homem de Deus.

terça-feira, 16 de abril de 2013

50 pessoas...PATRÍCIO MEDEIROS


O Patrício era um menino extraordinário que veio com a família, das barracas, para uma habitação social no Bairro de Perafita. Conheci-o ainda pequenito no Jardim de Infância mas foi sobretudo na escola do 1º ciclo que tive um maior contacto com ele. Desde novinho que revelava uma sensibilidade especial e diferente das demais crianças. Normalmente calmo e observador era vulgar vê-lo no jardim da escola a observar as flores. O seu realojamento no Bairro não foi sinónimo de melhores condições de vida. A desgraça abateu-se sobre aquela casa. O pai, sustento da família sofreu uma trombose e ficou incapacitado. A mãe ficou deprimida e a casa ficou sem rumo… notava-se que andavam andrajosos , sujos, magros. Faltava tudo naquela habitação. Não tinham luz, nem água, e muitas vezes eram vistos nos contentores do lixo à procura de comida. Ora o Patrício andava na escola…aí chegava diariamente cada vez mais branco, sempre com a mesma roupa e mal arranjado. Tinha no entanto um enorme sentido de família. Foi difícil descobrir que não havia comida naquela casa porque ele para proteger a mãe nunca se queixou da falta de refeições. Mas tudo ganhou grandes proporções e a anemia comprovada não podia permitir que aquela condição continuasse. Assim,  a sua sobrevivência levou-o a ele e aos irmãos mais novos, para uma instituição.!…Tenho saudades das conversas ingénuas e dos comentários sensatos com que me premiava cada dia que o levava ao "colégio". Parava para lanchar com ele e, ele para devorar comida comigo. Eu tinha apetite, ele tinha fome!…Com ele aprendi a ver o mundo de outra forma e a reparar em pormenores. O que para mim era banal para ele era extraordinário. Andar com ele em determinados locais era como que trazer ao meu lado alguém que tivesse vindo de outro mundo…a sua educação, humildade e sensibilidade ficarão perpetuamente na minha mente. Há anos que não sei dele!...sei o que ele me deixou!
 


Toques...

toque de saída da escola
Teu recolher obrigatório
Regresso a casa
Casa…campo de concentração
Onde, és escravo de um lar,
prisioneiro de uma pobreza,
vítima de loucas decisões 
abandonado a ti próprio.
E só, na confusão do caos e do nada
Enfiado em trapos sujos de dias
és alimento de parasitas…
sem alimento próprio.
Até quando?…
Enquanto sobreviveres?
Aguardas um toque de saída de casa!

Raquel Alves (2003)

50 pessoas...RAÚL GONÇALVES


Frequentava então o 7º ano de escolaridade do Liceu Rainha Santa Isabel. Uma turma supostamente mista que só tinha 3 rapazes . E a constituição desta turma era "sui generis". Não sei como em tempos revolucionários surgiam ideias tão cretinas. A minha turma era composta por alunos cujo nome iniciava por R. Então era sobretudo uma turma florida de tanta Rosa! Mas por lá andava uma Raquel, um Raul… Tinha 12 anos quando o conheci. Da mera camaradagem diária passou a algo mais especial. A constantes momentos a dois. Posso considerar que este foi o meu primeiro amor, no que isso tem de encantador, apaixonado e  puro. Pela primeira vez o meu coração adolescente brotou para um sentimento amoroso com uma intensidade avassaladora. O Raul era um adolescente querido,  muito terno e cavalheiro. O sentimento era recíproco mas a idade não permitiu o namoro e ficou o amor platónico! Foi no entanto algo muito marcante na minha vida. Um amor inspirador de poemas e diários. 

sábado, 6 de abril de 2013

50 pessoas...STEPHEN STOER


Ter tido o privilégio de o conhecer foi para mim inolvidável. Mencionar o seu inquestionável valor como professor e o impulso dado ao trabalho científico na área das Ciências da Educação, seria uma injusta distração. Não considerar as suas opiniões, seus saberes e estudos em matérias como a Multiculturalidade e teorias de exclusão social, seria insensatez. Mas, guardarei na memória, para além deste vasto conhecimento, a serenidade do seu olhar, a humildade (de quem é sábio), os laços que criava com os outros…também comigo. Fui sua aluna, senti realmente que, por trás do seu sorriso, havia um afeto natural e uma postura de abertura ao outro - aluno. Penso que se aproximava da visão de Rubem Alves em que“…os docentes, antes de serem especialistas em ferramentas do saber, deveriam ser especialistas em amor, intérpretes de sonhos.” Sorte que tive em conhecê-lo!
Sem duvida que como homem era também exemplar, tanto como companheiro, como pai…Grande homem este!
Ficou-me na memória para sempre… As pessoas boas morrem cedo!